Diálogos da Esfinge

Inicio aqui meus diálogos com a esfinge, afinando a escuta com o oráculo interior. Serei pergunta e resposta. Por vezes o silêncio, a lucidez e a loucura. Trocarei de papéis e de mistérios. Assim, caminho em direção à esfinge, despindo-me vagarosamente dos meus medos. E vou nua. Ao pé da esfinge, deposito o gesto e a intenção. Ergo os olhos e encaro o que me devora e não me apavora, nesse momento, essa fenda no abismo. Corro o risco da decifração. Eis-me aqui, nesses diálogos...

quarta-feira, abril 26, 2006

NA IMENSIDÃO DO LAGO



Os OLHOS CLAROS da esfinge no BAILE de MÁSCARAS

E a correnteza das águas levando um carro desligado...


Uma tempestade, um carro desligado à deriva, uma aflição quanto a manter o controle da direção e a atitude de ligar o carro, EU e a ESFINGE no esconde-esconde dos sentimentos tortos e perturbadores, e a escapada do perigo para as sombras do BAILE de MÁSCARAS. E os OLHOS CLAROS da esfinge. Essa aparição da esfinge, beirando a perdição total, cravou em mim uma consciência de pressentimentos, aqueles que chegam de jeito inesperado para trazer à tona o que no fundo se sabe perfeitamente bem, mas não boiou na consciência como um peixe morto na superfície de um lago de águas aparentemente estáticas. A visão em movimento mexeu com os meus nervos e o meu olhar. Impossível ignorar as aparições do oráculo, seus avisos enigmáticos, as tabuletas na porta do meu templo particular. Um carro desligado sendo engolido pela voracidade das águas de uma tempestade inesperada, violenta, assustadora. Implorei ajuda, pedi com todo o desespero dos dias possíveis desmoronando às nossas costas, mas a recusa passiva me atingiu como um golpe no estômago. Mesmo com o carro desligado, os braços cruzados ante o que me devorava também por dentro e pelas beiradas, assumi a direção daquele veículo morto, como quem toma um remo frágil às mãos de um anjo atônito para duelar com as águas de um Posseidon de mau humor e que encontrou a diversão de um brinquedo momentâneo. Estranho, lembro agora, girei o volante à esquerda e já bem no centro das águas bravias assumi sozinha o risco do caminho mais perigoso, conscientemente o mais difícil... À esquerda, o caminho do coração. Não sei como, um cicerone estranho, familiar, surge do nada, após a turbulência, e faz uma estranha condução para o BAILE de MÁSCARAS. Uma movimentação lenta e sombria dominava o cenário e o espaço daquele inusitado salão, seres seminus transitavam incógnitos, com uns olhos que comiam fundo uma fome existente e transbordante no meu coração. Presságios, aflições e um desassossego antigo de ver e sentir o que não compreendia, o que não aceitava, mas contaminava a claridade dos meus dias à luz do SOL. Os OLHOS CLAROS da esfinge assumiram o controle do BAILE, e travestiram-se em um corpo familiar, ambíguo, numa simbiose perfeita para me dizer o NOME, com a casca e o miolo da compreensão. Os OLHOS da esfinge pousaram dentro de mim como os olhos de um predador altivo, acordando os enigmas dos meus dias possíveis de paraíso para a antítese do que julgava o correr tranqüilo do rio da minha vida. Às vezes sinto aquele BAILE, com todos os seus simbolismos, linguagens cifradas, enigmas, rodopiando dentro de mim e nos dias que seguem no remanso. Aqueles OLHOS que gritaram como um enigma de resposta óbvia dentro da esfinge ronda mais que os meus pesadelos, minhas convicções e certezas. Os OLHOS me mostram as sombras da claridade dos meus dias, a ausência, os cortes, as fugas, o não existente, os não-movimentos que circundavam as minhas procuras. Aqueles OLHOS lançaram uma centelha de inquietação que havia esquecido, ou pelo menos tentado esquecer. E essa minha inquietação duela com os OLHOS da esfinge, todos os dias. Difíceis OLHOS de alcançar o cerne da visão que diz TUDO. O ímpeto é chegar lá, arrancar esse olho profundo e deixar o LAGO que me contempla dentro dos OLHOS vazar, com os seres que às vezes bóiam e me contam partículas do MISTÉRIO que também dorme dentro do meu olho que vê e perscruta as grutas atrás de cada fenda...

Goiânia, 26-4-2006.